Artistas e intelectuais passam temporada na capital baiana, palco de efervescência cultural e política
Guilherme Soares Dias
Caetano Veloso estacionou o carro no Rio Vermelho. A cena prosaica, que rendeu manchete do F5 quando ele fez o mesmo no Leblon, mudou de endereço junto com o cantor e compositor baiano nesse verão. As festas com músicos e novos artistas na casa de Caetano em Salvador foram concorridíssimas nos primeiros meses do ano. Por lá, passaram novos talentos como Hiran e Majur, que ganharam a produção de Paula Lavigne e devem se destacar este ano, fazendo com que a Bahia ganhe seus próprios representantes LGBTs na nova cena musical brasileira – um deles do rap, algo improvável até pouco tempo.
As cantoras Xênia França, Larissa Luz e Luedji Luna, baianas que vivem fora de Salvador, retornaram durante as férias de verão e formaram o poderoso trio Aya Bass, que resgata músicas de artistas negras. Uma resposta ao racismo estrutural da axé músic, que sempre deu destaque às cantoras brancas. Mas nem só os baianos passaram pela Bahia nesse período: os cantores Maria Gadu e Silva também estiveram por lá em longa temporada, fizeram novas parcerias, músicas e shows. Gadu chegou a declarar que ia se mudar.
Por que essa movimentação na cidade é mais relevante do que as notas diárias sobre onde vão e o que comem as celebridades? Por muitos motivos. Em resumo, é uma indicação de que a capital baiana vive um novo ciclo em que é referência para a classe artística do país. Não apenas em termos de uma “indústria da alegria e do prazer”, do turismo folclórico e predatório, mas da cultura enquanto movimento de pensamento e expressão. E, como se sabe, os movimentos culturais têm relação direta com o contexto político.
Política e turismo. Além disso, o turismo nessa época do ano é natural em uma cidade solar, rodeada de praias, e conhecida por suas festas no verão. Mas o movimento nesse 2019 foi além das festas de largo, consolidou-se como uma espécie de centro de resistência, onde cada um podia se manifestar como quisesse. E principalmente: onde não haviam bolsominions por toda parte. O presidente Jair Bolsonaro (PSL) não venceu em nenhuma zona eleitoral de Salvador e as manifestações de seus correligionários são menos comuns do que nas capitais do Sudeste.
Além disso, o carnaval foi recheado de fantasiados de laranja, em alusão a denúncia que diz que o PSL lançou candidatos apenas para engordar seu fundo partidário, além de gritos frequentes de “ei, Bolsonaro, vai tomar no cu”. Afinal, em uma cidade marcada pela cultura negra e de resistência, artistas e turistas vão em busca de um revigoramento pessoal, cultural, mas também político.
A Mídia Ninja, veículo de imprensa independente, instalou a Casa Ninja Bahia, na Barra. O local sediou debates sobre temas diversos com o “sofá na rua”, performances, shows e lançamentos de livros, como o “Revolução Laura”, de Manuela D’Ávila (PCdoB), candidata a vice-presidente em 2018 na chapa de Fernando Haddad (PT). A Casa também organizou movimentos como aulas de ioga gratuitas e ocupações como o “Preta Gorda na Praia”, que renderam um lindo ensaio, além de questionamentos contra a gordofobia. Uma revolução em forma de ações cotidianas.
A cidade, que já havia recebido em 2018 o Fórum Social Mundial, também foi palco do encontro da União Nacional dos Estudantes (UNE) em janeiro, que levou políticos de esquerda e estudantes de todo país para discutir a conjuntura política a partir de Salvador.
Uma série de fatores que fizeram com que esse verão bombasse mais do que os anteriores. A praia do Porto da Barra teve seus dias de “insuportável”, já que a faixa de areia ficou pequena para tanta gente. Lugares como a praia do Solar do Unhão, dentro de uma comunidade de mesmo nome, e do MAM (Museu de Arte Moderna) passaram a ser mais explorados. A cantora Anitta foi uma das que descobriu o local e gravou o clipe de “Bola, Rebola” – uma das músicas mais tocadas durante o carnaval do Rio.
Gentrificação. Festas de largo como Iemanjá e Bonfim atraem milhares de turistas todos os anos. E nesse 2019, o número de visitantes praticamente dobrou. Embora as festas tenham um mote religioso, elas também são celebradas como uma espécie de carnaval e são bastante marcadas pela política, com protestos e manifestações diversas, fugindo dos estigmas e polarizações de “sagrado” versus “profano”, “corpo” versus “mente”. Na contramão de um pensamento ocidental e eurocêntrico, é tudo junto ao mesmo tempo, o que torna esses festejos únicos, atraindo cada vez mais os olhares de quem mora em outros lugares.
Além das praias e festas lotadas, os preços também subiram durante a estação mais quente e cheia do ano. O cravinho, bebida mais famosa do Pelourinho, que era vendido por R$ 14 (a garrafa de 500 ml) subiu para R$ 16. Os sorvetes na Ribeira acompanharam a alta e subiram mais de 20% em pleno verão, entre outros produtos. É a famosa gentrificação que chega junto com novos visitantes e atrativos.
Uma amiga baiana se preocupava com essa “descoberta” da Bahia pelo povo do Sudeste. “Com que olhar eles vão enxergar tudo que acontece aqui? A Bahia preserva costumes e jeitos muito próprios. Isso será visto como exótico? E o que vamos fazer e o que vai acontecer com esses costumes a partir desse olhar?”, questiona.
Não é para ‘iniciantes’. Mas quem mais sofreu com a complexidade da Bahia foi mesmo o publicitário Nizan Guanaes e a agora ex-editora da Vogue, Donata Meirelles. Bilionário e baiano, Nizan anunciou a volta para a terra natal. A esposa comemorou seus 50 anos, convidando a alta sociedade soteropolitana e amigos de outras partes do país.
O que eles não esperavam é que as fotos de Donata sentada em uma cadeira usada habitualmente em terreiros de candomblé, rodeada de mulheres negras vestidas de baiana repercutissem tão mal. A festa foi lida como “Brasil Colonial”. Apesar de não ter esse tema, as imagens já tinham sido lidas como apropriação cultural ou uma ode à escravidão e causado um estrago irreparável. Nizan, que já tinha anunciado que levaria Obama para Salvador, voltou atrás e também desistiu de morar na cidade. Afinal, sua festa virou tema de discussão política e social – algo bem comum na Bahia.
Tem dendê. Agora o ano começa e para quem, como eu, cogitou permanecer em terras baianas mesmo após o fim do verão, os moradores avisam: trabalho não é tão fácil, o ritmo de festas diminui drasticamente e no dia a dia Salvador sofre com problemas bem reais e comuns nas demais grandes capitais: trânsito e violência. Mas o acolhimento e hospitalidade baiana e a oposição ao presidente continuam presentes. Importante saber que esse lugar, que foi centro de resistências no século XIX, em revoltas como as dos Malês e a Sabinada, continua emanando suas próprias forças para atravessar esse momento político difícil do país.
E para quem acha que Salvador é só moda de um verão, o publicitário Paulo Rogério Nunes, fundador da Vale do Dendê, uma aceleradora de empreendimentos de economia criativa, afirma que 2020 será o ano da cidade. É quando várias obras prometidas tanto pelo prefeito Antônio Carlos Magalhães Neto (DEM), que estará em seu último ano de mandato, quanto pelo governador Rui Costa (PT) vão sair do papel.
É o caso do Centro de Convenções, do Parque de Esportes Radicais, da ampliação do aeroporto, do Museu da Música, do novo corredor ligando a Orla ao Subúrbio Ferroviário, entre outros. Os investimentos vêm da concorrência entre prefeito e governador que tentam deixar um legado maior do que o outro para se garantirem nas próximas eleições. Mesmo tendo pouco perfil da esquerda, Rui se destaca entre os governadores do PT. Enquanto Netinho, como é chamado o prefeito, sonha em ser o próximo governador do Estado. Tantos movimentos atraem os olhares internacionais, como o festival Afropunk, que sonda em fazer na Bahia seu evento de música negra no Brasil a partir de 2020.
Paulo Rogério é enfático ao definir o diferencial de Salvador que tem atraído tanta gente: “cultura negra, cultura negra, cultura negra”. A contribuição e a fortaleza desse poder são inegáveis na cidade. Agora é fortalecer e aumentar esses novos movimentos que emanam de lá e participar dessa construção para que em 2020 eles sejam ainda mais potentes.
Edição: Cinthia Gomes e Dayse Porto
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“NAO QUEREMOS APENAS TER O DIREITO DE “SENTAR” NO “RESTAURANTE, EMPRESAS, LOJAS, TERRA,FAZENDA, CASA ETC” COM OS BRANCOS, QUEREMOS TAMBEM TER O PODER INTELECTUAL e ECONOMICO DE TER NOSSOS “RESTAURANTE, EMPRESAS, LOJAS, TERRA,FAZENDA, CASA ETC” E AS PESSOAS NAO VAO SE PREOCUPAR COM RACISMO E #PODERAO #IGUALMENTE E #LIVREMENTE EM #DIREITOS E #PODER #FINANCEIRO E #PODER #INTELECTUAL SE “SENTAR” COM QUEM ELAS QUIZEREM…”: MALCOLN X
Eles e elas roubam tido mundo e eles e elas mesmo se punem quando nao concordam entre si. Essa é a historia do Brasil colocar senhores e aebhoras da casa grande no poder esperar que eles e elas nao quebrem o chicote forte e ou fraco nas nossas costas. E no meio termos eles e elas se usam o poder para expor o outro ou putra para “mostrar” serviço. E manter a populaçao preta submissa. Enquando ele e elas no poder fazendo a manutençao para os pretos e pretas não subam ao poder. Daqui a 8 anos o Brasileiro cansa e vota em outro branco e outra branca…e esse ciclo vicioso nao acaba. Ah…se nos EUA tivesse 57% da populaçao preta…Hahaha!
Se os brasileiros e brasileiras não tem (empatia, respeito, compaixao, …).pelo seu propio povo; CLASSIFICANDO-OS a ponto de designar quem e que região, “merece” e quem não “merece” investimento e qualidade de vida digna; para dar desculpa de não ter que lutar e trabalhar por igualdade para todos e direta e indiretamente se “beneficiar” da desigualdade, e dos exodos e da pobreza, a ponto de se omitir e nao lutar e nemTRABALHAR ,muito menos pressionar suas liderancas; ou seja ser omisso; ao problema de desigualdade; para nao trazer as condições de vida do povo(patria-cios e patria-ciais) para o mesmo qualidade de vida. Entao, não esperemos que quem TRABALHOU, LUTOU, PRESSIONOU AS LIDERANCAS para chegar nesse lugar nos seus paises, tenham respeito, admiração, consideração, compaixão, pelo Brasil. Se esses paises tiverem a oportunidade de “coloniza” o Brasil não vai ser para ser “legalzimho” e pegar o Brasil pelas mãos e trabalhar para o trazer o Brasil e os brasileiros todos para qualidade de vida que os brasileiros da classe media e rica não querem agir, trabalhar, lutar, presionar etc. para fazer no Brasil… um bando de preguiçosos, oportunistas, corruptos e hipocritas. Se as AUTORIDADES não são confiaveis no seus países pode ter certeza que as AUTORIDADES e os ENDINHEIRADOS(AS) também são tratados como a desconfiança dada ao mau-carater:: ja’ que não se pode evita-los ou evita-las; para dar o bom exemplo de civilidade; se convida “certas classes de gente” para as festas; encontros, congressos; simpósios, mas sempre com a mão na carteira e sem dá as costas para eles e elas… e torcendo para eles e elas não veham, e se vierem se inspirem nos bons exemplos que veemm e comecem a trabalhar em seus paises!