Kwanzaa: o que é e como funciona a celebração preta da diáspora que “substitui” o natal

Nem todo mundo se identifica com o natal e seus princípios cristãos, capitalistas e eurocêntricos, não é mesmo? Os negros da diáspora africana criaram nos Estados Unidos a Kwanzaa, uma festa pan-africanista, interreligiosa, que dura sete dias. No Brasil, a celebração começa a ganhar forçar entre pessoas negras conscientes da necessidade de reconstruir essa memória.

A celebração da Kwanzaa ocorre de 26 de dezembro até 1 de Janeiro. Toda a simbologia é representada em um candelabro, chamado de Kinara. Nele, são colocadas sete velas – três vermelhas, três verdes e uma preta, no meio – cada uma simbolizando um princípio Nguzo Saba (os sete princípios), que representam valores culturais pan-africanistas.

De acordo com a AfroTV, a cada dia, uma vela de cor diferente é acesa e colocada em um altar com frutas e uma espiga de milho depositada por cada criança que houver na casa. Depois, todos bebem e exclamam “Harambee”, reverenciando os antepassados. A exclamação significa “reúnam todas as coisas” ou “vamos fazer juntos”.

Os princípios são baseados nos ideais das colheitas dos primeiros frutos. O nome “Kwanzaa” deriva da expressão “matunda ya kwanza”, que significa justamente “primeiros frutos” em swahili, a língua original mais falada entre as centenas que existem na África. No continente, os costumes associados às colheitas são importantes e respeitados. Em algumas famílias é comum haver a troca de presentes e livros artesanais que podem ser, ou não, focados nos princípios de cada dia, por meio de rituais, conversas, histórias, poesias, danças e muita festa são demonstrados cada um dos princípios.

HISTÓRIA:

Segundo o site  Somos Todos dos Um, a festa dos “primeiros frutos” é típica dos povos ancestrais, a origem do Natal cristão seria uma celebração desse tipo, “a festa da vitória da vida contra a morte, da luz contra as trevas, da colheita farta que garantia a continuidade da tribo contra a ameaça da fome e do extermínio.”

Não é pouca coisa. Na África, os rituais associados à colheita existiram no passado e existem ainda hoje: “Estas celebrações eram comuns nos tempos antigos, mas também existem hoje, cultivadas por imensos grupos sociais, como os zulus, tanto quanto por pequenos agrupamentos, como os matabelos, os thonga e os lovedus, todos do sudeste do continente africano”.

A ideia de criar um feriado “pan-africano” é atribuída a um professor de estudos africanos da Universidade da Califórnia, Maulana Karenga, num tempo difícil, que ficou conhecido como “o movimento pelos direitos civis americanos”, mas que durou mais de uma década, teve ares de guerra civil e virou a sociedade racista dos EUA literalmente de cabeça para baixo.

A Kwanzaa foi celebrada pela primeira vez de 26 de dezembro de 1966 a 1 de janeiro de 1967, Martin Luther King seria assassinado um ano mais tarde e os negros americanos brigavam pelo direito de voto. Para Makini Olouchi, uma das organizadoras da festividade em Salvador, “celebrar a Kwanzaa no Brasil, significa viver nossa africanidade numa perspectiva panafricanista. É manter-se conectado com toda ancestralidade africana do mundo e manter aceso o espírito de celebração pelas boas colheitas que tem sido feitas, apesar das adversidades”.

OS SETE PRINCÍPIOS DA KWANZAA:

A Kwanzaa está centrado nos sete princípios, ou Nguzo Saba, que representa os valores da família, da comunidade e da cultura para os africanos e para os descendentes de africanos. Os princípios foram desenvolvidos pelo fundador da Kwanzaa, Dr. Maulana Karenga, baseados nos ideais das colheitas dos primeiros frutos.

Os princípios da Kwanzaa são:

1 – Umoja : união. Estar unido como família, comunidade e raça.

No primeiro dia do Kwanzaa, 26 de dezembro, o líder ou ministro convida todos a se juntarem e os cumprimenta com a pergunta oficial: “Habari gani?” (O que está acontecendo?), à qual eles respondem com o nome do primeiro princípio: “umoja”. O ritual é repetido em cada dia de celebração do Kwanzaa, mas a resposta muda para refletir o princípio associado àquele dia.

A vela preta é acesa e o dia gira em torno da reflexão e o esforço para manter a unidade na família, comunidade, nação e raça.

2 – Kujichagulia : auto-determinação. Responsabilidade em relação a seu próprio futuro.

No segundo dia, por exemplo, a resposta é “Kujichagulia”. Em seguida, a família diz uma prece. Depois, eles recitam um chamado de união, Harambee (Vamos nos unir).

A libação é então realizada por um dos adultos mais velhos, e uma pessoa (geralmente a mais jovem) acende uma vela vermelha do Kinara. O grupo discute o significado do princípio do dia e os participantes podem contar uma história ou cantar uma música relacionada a esse princípio. Os presentes são oferecidos um a cada dia ou podem ser todos trocados no último dia do Kwanzaa.

3 – Ujimatrabalho coletivo e responsabilidade. Construir juntos a comunidade e resolver quaisquer problemas como um grupo.

No terceiro dia da Kwanzaa, 28 de dezembro, acende-se a vela verde e o ministro pergunta “Habari gani?” (O que está acontecendo?) e a família responde: UJIMA. Nesse dia a reflexão é sobre a construção da comunidade e resolução de problemas de forma conjunta.

4 – Ujamaaeconomia cooperativa. A construção e os ganhos da comunidade através de suas próprias atividades.

No dia 29 de dezembro, mais uma vela vermelha é acesa e a tradição da pergunta diária é seguida na Kwanzaa. “Habari gani?” “Ujamaa”. A reflexão do dia é sobre a construção, lucros e ganhos com os próprios negócios e lojas da comunidade.

5 – Niapropósito. O objetivo de trabalho em grupo para construir a comunidade e expandir a cultura africana.

No dia 5 (30 de dezembro), mais uma vela vermelha é acesa no Kinara (candelabro). Depois da tradicional pergunta, dessa vez respondida com a palavra “Nia”, o grupo discute sobre o princípio. O objetivo do trabalho coletivo da comunidade e o propósito de propagar a cultura africana.

6 – Kuumba: criatividade. Usar novas idéias para criar uma comunidade mais bonita e mais bem-sucedida;

O banquete do Kwanzaa é no dia 31 de dezembro (sexto dia). Ele não inclui só comida, é a grande celebração, que inclui cantar, orar e celebrar a história e a cultura africana. A vela acesa é a vermelha. “Habari gani?”, pergunta-se. “Kuumba”, responde-se. A reflexão do dia é focada em meios criativos para deixar a comunidade mais bonita, próspera e bem-sucedida.

7 – Imani: fé . Honrar os ancestrais, as tradições e os líderes africanos e celebrar os triunfos do passado sobre as adversidades.

O dia 1º de janeiro, o último dia do Kwanzaa, é um momento de reflexão para cada um e para todo o grupo.  A reflexão é sobre honrar os ancestrais e as tradições, assim como celebrar a vitória das lutas do povo africano e seus descendentes.

As pessoas se perguntam: “quem sou eu?” “sou realmente quem digo que sou?” e “sou tudo o que posso ser?”. A última vela verde do Kinara é acesa e então todas as velas são apagadas sinalizando o fim do feriado.

*com informações do Correio Nagô, Afro TV, HowStuffWorks Brasil e Pele Negra

[button link=”https://www.instagram.com/p/CJOZn0qhBWp/” color=”default”]Veja mais sobre Kwanzaa[/button]

 

LEIA MAIS:

Plataforma de streaming preta, Wolo TV quer atingir massa e fazer pontes internacionais

 

Compartilhe:
Avatar photo
Redação

O Guia Negro faz produção independente sobre viagens, cultura negra, afroturismo e black business

Artigos: 706

5 comentários

  1. Agradeço a explicação. Nossa família esta fazendo a meditação, mas ainda não temos as velas. Mas é a primeira vez, estamos introduzindo essa tradição.

  2. Parabéns pela matéria 👏👏👏
    Estou realizando um ciclo de palestras sobre africanidades e utilizarei está reportagem para explicar a celebração de Kwanzaa👏👏
    Obrigada pela partilha🥰🙏

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *