Para combater o racismo, profissionais liberais negros formam coletivos

Guilherme Soares Dias

Profissionais liberais de diferentes áreas lançaram coletivos para combater o racismo estrutural que atinge todas as esferas da sociedade brasileira. São arquitetos, médicos, psicólogos, publicitários, jornalistas e cineastas negros que se juntaram para dar respostas a um sistema que exclui pessoas negras dessas carreiras e as torna predominantemente exercidas por brancos. São profissões que pedem para além do diploma universitário, um investimento contínuo e que acabam por ser ainda mais desafiadoras para quem tem uma trajetória marcada pelas marcas do racismo.

Em 2019 surgiram institutos liderados por médicos, psicólogos e cineastas, que se juntam a coletivos de arquitetas, publicitários, advogados e jornalistas, que já vinham fazendo ações com a intenção de aumentar a presença das pessoas negras em suas profissões. Confira as iniciativas:

Médicos
O Instituto Luiza Mahin (ILM) é a primeira associação de médicos e estudantes negros e foi lançado em 6 de dezembro de 2019 na Assembleia Legislativa de São Paulo (foto acima). A intenção é promover e assegurar equidade de direitos políticos, educacionais, sociais e econômicos para alavancar a luta antirracista, garantindo saúde e bem-estar para a população negra. “Queremos contribuir para a construção de uma sociedade na qual todos os indivíduos tenham direitos iguais sem prejuízos por pertença racial”, afirma Ionata Smikadi, presidenta da associação. O ILM pretende ainda garantir que leis que assegurem os direitos sociais sejam cumpridas, além de promover a saúde integral das pessoas negras nos âmbitos de ensino, pesquisa e assistência em saúde. www.institutoluizamahin.org

Cineastas

O Instituto Nicho 54 nasceu em novembro de 2019 com foco em promover a formação de jovens profissionais negros do audiovisual. Para fomentar a representatividade racial – incorporando perspectivas de gênero, classe e orientação sexual -, a iniciativa atua na estruturação de carreiras de negros em posições de liderança criativa, intelectual e econômica. O projeto se inspira em experiências internacionais que tratam da reparação dos cenários de exclusão de raça e gênero no audiovisual, como o programa Diversity no European Film Market (Berlinale). O instituto surge com a intenção de combater uma realidade que mostra que das 10 maiores bilheterias nacionais de 2002 a 2014, apenas 3% foram assinadas por um cineasta negro, só 2% tiveram roteiristas negros envolvidos e nenhuma obra foi dirigida ou roteirizada por uma mulher negra, de acordo com a pesquisa “Raça e Gênero no Cinema Brasileiro” do Grupo de Estudos Multidisciplinares da Ação Afirmativa (GEMAA-IESP-UERJ). https://www.facebook.com/nicho54brasil/

Arquitetas

O projeto Arquitetas Negras foi fundado pela arquiteta e urbanista mineira Gabriela de Matos em 2018. A primeira ação do projeto envolveu o mapeamento de 370 arquitetas negras brasileiras distribuídas por todo o território nacional. A lista está disponível online com o objetivo de alcançar mais profissionais. “Os trabalhos desenvolvidos por elas são de natureza diversa, entretanto, por se tratar de uma produção desenvolvida por mulheres negras, temos a sensibilidade do olhar e das ações voltadas para a diminuição das desigualdades de gênero e raça presentes nosso campo de conhecimento e em nossa sociedade”, ressalta Gabriela. Em agosto de 2019, foi lançado o primeiro volume do livro “Arquitetas Negras”. Uma rede foi formada para consolidar o network, prestação de serviços e fortalecimento do debate de gênero e raça junto às instituições. Além disso, foi realizado neste ano o projeto Lab Arquitetas Negras, em São Paulo, com o intuito de promover o aprimoramento profissional. https://www.facebook.com/arquitetasnegras/

Psicólogas

Desde 2016 um coletivo de psicólogas negras realiza um trabalho de atendimento clínico para mulheres negras. O projeto da Roda Terapêutica das Pretas começou com 10 profissionais e hoje conta com cerca de 40 psicólogas voluntárias e ativistas, que promovem atendimentos grupais e oficinas para mulheres negras nas diferentes zonas da cidade São Paulo e também na região metropolitana. “As questões raciais dentro da psicologia são negligenciadas e surge a necessidade de psicólogas negras proporcionarem uma escuta mais qualificada para essa demanda. Há incômodo das pacientes negras ao relatarem experiências com psicólogas brancas, que acabam sendo silenciadas quando traziam questões raciais”, resume Beatriz Moreira, psicóloga clínica, para o “Nós, mulheres da periferia”. https://www.facebook.com/rodaterapeuticadaspretas/. A Rede Dandaras tem objetivo parecido e foi criada em 2016 pelas psicólogas Laura Augusta e Tainã Vieira no intuito de promoção de saúde e identidade e resistência das mulheres negras. Há mapeamento de psicólogas negras e atendimento às mulheres negras. https://rededandarasblog.wordpress.com/

Publicitários

Formado em 2017, o grupo Publicitários Negros surgiu com o objetivo de reunir profissionais negros da comunicação para que troquem conselhos, indicações, benchmarks e novas ideias, gerando capital social, cultural e profissional. O grupo é uma frente de transformação contra a estrutura branca dos espaços de comunicação, em busca de maior representatividade. Para isso, reúne profissionais de diferentes áreas e idades, que geram relações entre si para maior fortalecimento profissional. No Instagram, o grupo tem ainda um perfil que apresenta os publicitários negros, individualmente, a partir de sua formação e área de especialização, quebrando o estereótipo de que “não há negros nessa área”. Atualmente, algumas iniciativas de inclusão racial têm inserido profissionais negros no mercado, como é o caso de 20/20, da JWT, da Keneddy e da W+K. https://www.facebook.com/PublicitariosNegros/

Jornalistas

A Comissão de Jornalistas pela Igualdade Racial (Cojira) existe desde 2001 com a intenção de auxiliar o Sindicato do Jornalistas de São Paulo na atuação mais efetiva com relação à questão racial. A comissão foi replicada em estados como Rio de Janeiro, Alagoas e Rio Grande do Sul e tem como objetivo mapear e analisar a situação dos jornalistas negros; acompanhar com olhar crítico o noticiário relacionado à questão racial; estimular a capacitação dos profissionais que já atuam na imprensa para que tenham uma melhor compreensão da questão racial; criar oportunidades para que os jornalistas negros, em especial, e os jornalistas sem recursos financeiros, de maneira geral, tenham acesso aos mecanismos de aperfeiçoamento técnico-profissional; organizar um banco de dados sobre a questão racial e a imprensa negra. https://www.facebook.com/cojirasp/

Advogados

A Associação Nacional de Advocacia Negra (ANAN) foi lançada em agosto na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp). A associação foi criada em 2016 pelo advogado Estevão Silva e possui mais de 1,5 mil profissionais associados em todo o país. O objetivo é desenvolver estratégias de combate ao racismo estrutural no direito. Uma das metas é aumentar o número de profissionais negros em órgãos do sistema de justiça e escritórios de advocacia. Dados do Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdade (Ceert) mostram que presença de advogados negros em grandes escritórios, por exemplo, ainda é baixa. Entre os profissionais brancos, 10,1% são estagiários e 48,3% são sócios e advogados juniores, plenos ou seniores. Já entre os negros, 9,4% são estagiários e nos cargos mais elevados, o número é estatisticamente irrelevante, menos de 1%. “Queremos fomentar a gestão de negócios dentro da própria comunidade negra para que os advogados tenham seus próprios escritórios e contratem profissionais negros de outras áreas também”, afirma Rosana Rufino, vice-presidente da ANAN e advogada.  Como referência na busca por direitos da comunidade negra, a ANAN tem no norte os advogados Luiz Gama, considerado fundamental no processo de abolição da escravatura, e Esperança Garcia, primeira advogada negra do Piauí. https://www.facebook.com/associacaodaadvocacianegra/

 

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Redação

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