Pelourinho: não tem como pisar sem ouvir os gritos de dor

Por Jonathan Raymundo*

Não tem como pisar no Pelourinho sem ouvir os gritos de dor. Eu ouvi todas as vezes que pisei lá. Senti o pavor e o orgulho dos meus ancestrais. Sempre afirmo que o exercício ético e político do historiador é trazer à tona aqueles que a vitória do poder tentam esquecer. O historiador empresta o seu corpo, seu tempo, sua técnica, seu talento, seu trabalho aos derrotados de todas as épocas.

Tentando assim, como Exu, acertar um pássaro ontem com um pedra que só taca hoje. Fico relaxado até pisar no Pelourinho. Lá meu corpo enrijece, meu pescoço se ergue e sou pura arrogância. Meu caminhar é vingança, superação, retorno. Depois de tudo que fizeram e fazem para varrer a melanina do mapa terão que me aturar pisando em cada pedra sabendo da dor e do poder que existe em ainda estar aqui.

Dr. Jhon Henrik Clarke afirma que quis o destino fazer dos africanos o primeiro exemplar da humanidade e se o destino ainda nos preservou depois de tanta barbárie é porque caberá a nós oferecer a última humanidade. Na Bahia eu cumpri um combinado que há muito tempo fiz comigo. Andando da Barra ao Subúrbio meu corpo não desvia diante dos brancos senhores de tudo.

Meu corpo não tem o direito de desviar, nem se encolher. Não depois de todo sangue que meus ancestrais derramaram para que eu pudesse ser livre. Entenda, você é o resultado de tanto sacrifício. Você é fruto. Vocês são milhares e milhares de lágrimas, de coragem, de beleza, de África. Ande, pise, olhe. Ande com mil pernas, pise com mil pés, olhe com mil olhos. Orgulhe-se!!! Você é o sonho e a vingança dos nossos ancestrais. Seja essa grande vitória!

*Professor de História e Filosofia. Palestrante. Escritor. Produtor cultural. Criador e Organizador do @wakandainmadureira.

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