Museu das Favelas abre no Palácio dos Campos Elíseos em SP

O Museu das Favelas abre suas portas ao público no sábado (26/11) com a exposição FAVELA-RAIZ, uma ocupação-manifesto que representa o primeiro movimento de transformação do Palácio dos Campos Elíseos, reverenciando a memória e as heranças das lutas dos que vieram antes e dos que seguem resistindo na construção desta história.

O termo “favela”, cujo nome se popularizou a partir do início do século XX ao denominar um sistema de habitações populares no país, é  derivado de um tipo de árvore com espinhos, flores, frutos e sementes altamente nutritivas muito comum na caatinga e, especificamente, no Morro da Favela, em Canudos, no sertão da Bahia. Os soldados da Guerra de Canudos, convocados a combater os membros da comunidade liderada por Antônio Conselheiro, ali se instalaram, dada a ampla visão oferecida do vale e, ao retornarem para o Rio de Janeiro, sem a assistência prometida pelo Governo, ocuparam o atual Morro da Providência, que passou a ser chamado de Morro da Favela. Desde então, “favela” passou a representar o tipo de organização urbana ali criada: barracões de madeira improvisados, sem infraestrutura, situados nos morros. 

A exposição que abre o Museu surge em forma de ocupação-manifesto, evocando as raízes da favela. É um símbolo de saudação às tradições, à ancestralidade, à maternidade, aos abrigos materiais e afetivos que envolvem os habitantes e a tudo o que ali foi semeado e colhido. A ocupação é composta por cinco partes, sendo três internas e duas externas.

No hall de entrada há esculturas tecidas em crochê, criadas pela artista Lidia Lisbôa com a colaboração de 7 mulheres do Coletivo Tem Sentimento e da Cooperativa Sin Fronteras, grupos de mulheres da vizinhança do Museu. “O Museu das Favelas tem como premissa máxima o trabalho colaborativo com as pessoas que vivenciam o cotidiano das favelas e periferias. Processos como este, representam um diferencial na gestão de uma instituição museológica, que no caso do Museu, além desse processo colaborativo, propõe a articulação social e processos de geração de renda como pilares transversais importantes”, afirma Daniela Alfonsi, Diretora do Museu.

A sala expositiva lateral traz uma instalação audiovisual sensorial, cuja curadoria selecionou imagens de 20 fotógrafos e produtores de conteúdos de diferentes periferias do Brasil. A instalação, chamada “Visão Periférica”, revela aos visitantes a multiplicidade das experiências nas favelas, despertando memórias afetivas por meio do cruzamento de linguagens. No final do percurso interno da exposição, haverá uma instalação no salão de espelhos do palácio, com criação sonora do rapper Kayode, exaltando os diferentes modos de se pensar a beleza.

No ambiente externo, haverá uma instalação que sintetiza a história do Palácio dos Campos Elíseos, com pesquisa de História da Disputa e produzido com artes em serigrafia pelo Coletivo XiloCeasa. Nos jardins, Paulo Nazareth – conhecido por suas andanças ao redor do mundo e seu trabalho que questiona os limites da performance como linguagem artística – traz uma das instalações de seu projeto “Corte Seco”, em homenagem à Maria Beatriz Nascimento: uma escultura de alumínio, de seis metros de altura, retratando essa que é uma mulher negra, historiadora, poeta, intelectual e ativista. 

“Vale ressaltar que, quando nós trazemos aqui historiadores que vão contar a história pela visão dos que foram esquecidos, marginalizados, vencidos em guerra, gentrificados, é simplesmente dizer para o que viemos. É mostrar que o Palácio dos Campos Elíseos terá uma nova composição, que essa arquitetura, hoje, servirá para visibilizar aqueles que outrora foram postos pra fora daqui. As exposições e instalações propostas mostram o quanto nós valorizamos os nossos artistas e teóricos. Então, a partir de sua abertura, o Museu das Favelas mostra sua marca institucional, que é dar voz e vez a quem está e sempre esteve construindo, mas que sempre foi invisibilizado. Então, se preparem para fazer uma viagem para o outro lado da história”, salienta Carla Zulu, Coordenadora de Relações Institucionais do Museu das Favelas. 

FEIRA PRETA

O Museu das Favelas recebe também a exposição “Identidade Preta: 20 anos de Feira Preta”, em comemoração ao maior evento de cultura negra da América Latina. Realizada pelo Preta Hub, liderado por Adriana Barbosa, a exposição traz de modo lúdico a história de um dos primeiros eventos de valorização da cultura empreendedora negra e periférica de São Paulo. Como parte da parceria, além da exposição, o Museu das Favelas receberá, no final de semana da abertura, o SPerifas, versão pocket da Feira de Empreendedores. 

Antes de sua abertura, o Museu realizou um ciclo de encontros com lideranças, artistas, agentes e produtores atuantes nas periferias do país, rodas de conversas sob o predicado “Ser Favela”, com o intuito de trocar experiências e construir um caminho colaborativo que precede o processo de curadoria e programação. Em reverência ao Dia da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha, nos dias 30 e 31 de julho, uma ativação especial e intitulada ABRE-CAMINHOS foi proposta como experiência de acolhimento. Na ocasião, recebendo o público pela primeira vez, mulheres periféricas e coletivos de mulheres da vizinhança do Museu ocuparam o salão do espaço em uma feira de empreendedorismo, com diversos de seus produtos e criações à venda; o público assistiu às apresentações de Bernadete do Peruche (matriarca do samba paulista) e Nega Duda (sambadeira do Recôncavo Baiano), além de participar de oficinas de dança, intervenções culturais, rodas de conversa e brincadeiras destinadas às crianças. 

Localizado no Palácio dos Campos Elíseos, o Museu das Favelas busca uma conexão direta com as experiências de quem vive nas favelas no cotidiano, em sua dimensão individual e coletiva, partindo de um local de pluralidade e diversidade de narrativas que surgem com a proposta de ser um ponto de encontro, de passagem, de acolhimento e de potencialização das favelas, de suas memórias e produções. A busca é por ampliar o olhar para além de uma imagem cristalizada do que é a favela e, também, do que é um museu, construindo uma visão que inclui também as vivências que partem de periferias, ocupações, assentamentos, regiões quilombolas, ribeirinhas e outros espaços que são distintos, mas que compartilham as mesmas histórias de segregação e resistência. Inserido numa arquitetura colonial, o Palácio revela, ainda, as ambiguidades socioeconômicas que envolvem territórios favelizados e propõe novos olhares ao prédio, ressignificando-o e permitindo novas possibilidades de refletir sobre as nossas histórias. 

São essas e outras narrativas que são construídas para lembrar que favela é uma experiência que marca pessoas, saberes, conhecimentos e territórios, atravessando o cotidiano de milhões de brasileiros. A potência das favelas inspira, então, o que esse museu se propõe ser: um local de encontro e acolhimento, incubador de ideias e propositor de movimentos. 

SERVIÇO 

Museu das Favelas

Palácio dos Campos Elíseos

Entrada pela Rua Guaianases, 1024 – São Paulo

De terça a domingo, das 9h às 17h (com permanência até as 18hs)

Entrada GRATUITA | ingressos poderão ser retirados de forma antecipada no site e, também, de maneira presencial no dia da abertura.

PROGRAMAÇÃO

Exposição Favela-Raiz

A partir de 26/11

das 9h às 17h (com permanência até as 18hs)

Exposição Identidade Preta: 20 anos de Feira Preta

A partir de 26/11

das 9h às 17h (com permanência até as 18hs)

Especial SPerifas – Dias 26 e 27/11

Instituto SulAmérica apresenta: Programação de Abertura

DIA 26/11, SÁBADO

9h às 12h | Praia Literária [intervenção que ocupa espaços com muitas brincadeiras de verão, piscina de bolinhas, bolinha de sabão, túnel e uma cesta de livros pop-ups para divertir as crianças]

10h | Prática de Kemet Yoga [Jardim*, mediante retirada de senha]

11h Aulão de funk com Renata Prado [Jardim*, mediante retirada de senha]

12h às 17h | DJ Vivian Marques [Jardim]

14h | Exibição do filme Orí, seguido de debate com Oswaldo Faustino & Lenny Blue [Auditório]

DIA 27/11, DOMINGO

9h às 12h | Praia Literária [intervenção que ocupa espaços com muitas brincadeiras de verão, piscina de bolinhas, bolinha de sabão, túnel e uma cesta de livros pop-ups para divertir as crianças]

11h | Aulão de funk com Renata Prado [Jardim*, mediante retirada de senha]

15h30 | Contação de Histórias para crianças e adultos, com Beatriz Barros [Jardim]

17h | Prática de Kemet Yoga [Jardim*, mediante retirada de senha]

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SOBRE O MUSEU

O Palácio dos Campos Elíseos (antigo Palacete Elias Chaves), situado na Avenida Rio Branco, foi projetado pelo arquiteto alemão Matheus Häusler, com construção iniciada em 1890 e finalizada em 1899 para ser a residência do cafeicultor e político Elias Antônio Pacheco e Chaves e sua família. O imóvel, dividido em quatro pavimentos, com  uma área construída de aproximadamente 4.000 m², foi inspirado no Castelo de Écouen, na França. Em 1911, o palacete foi comprado pelo Governo de São Paulo, tornando-se residência oficial dos governadores. Após uma reforma de ampliação, em 1935 torna-se oficialmente Palácio de Governo até 1965, quando houve a transferência para o atual Palácio dos Bandeirantes, no Morumbi. Durante os anos de 1967 e 1972, ficou fechado para restauro por causa de um incêndio que destruiu parte do edifício. O palácio foi tombado no ano de 1977 pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico (CONDEPHAAT), sendo sede administrativa de diferentes secretarias e órgãos do governo até 2006, quando foi fechado novamente para seu segundo restauro. O Centro de Referência em Inovação do SEBRAE foi a última instituição que ocupou o prédio (2017-2019) antes do Museu das Favelas. 

O Museu das Favelas, ao ocupar o Palácio dos Campos Elíseos, símbolo de uma estrutura de poder segregacionista, anuncia esse novo momento em que vozes e pensamentos que são invisibilizados reivindicam o lugar que lhes é cabido na história e na cultura brasileira. Além de proporcionar mobilidade e acessibilidade de forma interconectada com demais regiões de São Paulo e outras cidades e estados, é simbólico, então, ter o equipamento cultural instalado neste antigo ícone da riqueza e do luxo para uma São Paulo “moderna”, em um projeto de “bairro modelo”. O museu não pretende apenas ocupar, mas ser ocupado. Assim, a instalação do Museu questiona, critica, tensiona os discursos, significados, narrativas, sentidos e símbolos prepostos, por meio da novamente destacada ocupação, reatualização e reconfiguração dos usos. Aqui – e não só – se faz  urgente  que outras narrativas e discursos possam tomar novo sentido. Além disso, tendo em vista o histórico de ocupação da região central da cidade, é estratégica a localização para que se possa fortalecer laços com grupos sociais que resistem para permanecer no local.

O Museu das Favelas tem como premissa máxima um trabalho de reparação social, por meio do protagonismo das pessoas de favela na gestão, na contratação de fornecedores, na criação de rupturas de narrativas, partindo da construção coletiva e compartilhada a ser constituída por meio do relacionamento com a vizinhança, do mapeamento constante de iniciativas que geram impacto social, cultural, econômico nas favelas, escuta ativa e visitas periódicas a espaços e organizações das favelas de São Paulo e do Brasil.

Parte de um local de pluralidade e diversidade de narrativas, que surge com a proposta de ser um ponto de encontro, de passagem, de acolhimento, um ambiente de pesquisa, preservação, produção e comunicação de memórias e histórias das favelas brasileiras. Ele constrói uma visão expandida que inclui também as vivências que partem de periferias, ocupações, assentamentos, regiões quilombolas, ribeirinhas, entre outras; espaços distintos, mas que compartilham histórias de segregação e resistência.

Trata-se de uma instituição que parte do passado, perfazendo o presente para contribuir com novos caminhos para o futuro, partindo do princípio de que os caminhos para mudança precisam passar pelas vivências de favela, por suas manifestações culturais e pela potência dos que ali resistem, inovam e criam. E desta forma, busca ampliar o olhar, para além de uma imagem cristalizada do que é a favela e, também, do que é um museu. 

Diante disso, o Museu das Favelas dedica seus esforços à oferecer ao público um espaço de convivência, produção e acolhimento, abertos à proposição de grupos e coletivos das favelas, além de Exposições e Programação Cultural, Ações Educativas, Centro de Referência e Pesquisa, Biblioteca, Centro de Empreendedorismo e Economia Criativa.

Neste primeiro ano de vida, a equipe do Museu dedica-se a preparar este prédio para ser ocupado pelas favelas, material e simbolicamente. Entre o final de 2022 e o ano de 2023, o visitante poderá conhecer e participar de atividades no jardim, e nas salas do piso térreo e inferior,  enquanto os pavimentos superiores são preparados para receber a futura exposição de longa duração e outras instalações.

A programação será gratuita, com funcionamento de terça a domingo, das 9 às 18hs. O Museu das Favelas está localizado no bairro Campos Elíseos, em São Paulo, ao lado do Terminal de Ônibus Princesa Isabel. O acesso principal ocorre pelo portão na Rua Guaianases, nº 1024, mas é possível entrar também  pela na Avenida Rio Branco, nº 1269. Não há estacionamento no local.

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Redação

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