Com um ano mais flexível quanto à pandemia, planejar viagens se tornou uma possibilidade mais segura, dessa forma, o Guia Negro mantém a missão de incentivar o engajamento de mais viajantes negros em experiências turísticas. Com a ideia de ocupar espaços e tornar cada vez mais possível o afroturismo, seguimos indicando lugares de cultura negra, histórias e diversas vivências para promover um turismo mais inclusivo, com outras perspectivas de roteiros pensados para a população preta. A partir disso, elaboramos nossa lista com oito lugares para você conhecer em 2022, entre eles estão lugares nacionais e internacionais.
Confira:
1 – Cachoeira (BA)
A cidade baiana é considerada Monumento Nacional, tombada pelo Instituto do Patrimônio Histórico Artístico Nacional, em 1971. O município fica no Recôncavo Baiano, às margens do Rio Paraguaçu e é conhecido por concentrar inúmeros terreiros de Candomblé, como o Seja Hùnde – Roça do Ventura, um dos principais terreiros da nação Jeje. Como o sincretismo religioso foi predominante para resistir à opressão religiosa e cultural da população preta, a estratégia resultou na criação da Irmandade Nossa Senhora da Boa Morte – vale a pena visitar a sede da confraria afro-católica, na Rua Ana Nery, 41, que se organizou para venerar Nossa Senhora da Boa Morte, mas que sincretiza as divindades africanas burlando a intolerância.
Há também a Igreja Matriz Nossa Senhora do Rosário, que ao lado da Irmandade Nossa Senhora da Boa Morte, organiza durante o mês de agosto a festa da Boa Morte, uma das celebrações mais importantes da cidade. Belém é um distrito de Cachoeira e uma das vilas mais antigas do lugar, lá há o Banheiro de Belém, onde as águas formam um riacho e convidam moradores e visitantes para um banho. Há também as cachoeiras da Levada (Poço Mãe d’Água), do Japonês, do Saco e da Murutuba fazendo jus ao nome da cidade, além de diversos quilombos. A Casa Preta Hub inaugurou uma unidade na Praça 28 de Junho e a Afrotours tem organizado vivências na cidade.
2 – São Luís
São Luís é conhecida como a Jamaica brasileira por sua ligação com o reggae. O centro histórico pulsa cultura negra, com apresentações frequentes de tambor de crioula e bumba-meu-boi. A cidade também abriga terreiros de Tambor de Mina, uma religião de matriz africana tradicional do Maranhão. O bairro da Liberdade é considerado maior quilombo urbano do mundo. A região é formada por quatro bairros próximos ao Centro: Liberdade, Camboa, Vila Goreth e Fé em Deus. No local estão preservadas crenças e manifestações culturais afro-brasileiras. O Instituto Da Cor ao Caso organiza o Caminho Ancestral que destaca a história negra da cidade. Outra dica é o restaurante Cozinha Ancestral, um projeto de arte, cultura e comida.
3 – Ubá (MG)
Conhecida como Cidade Carinho, Ubá fica no interior de Minas Gerais e é um dos destinos indicados pela viajante Amina Bawa. Por ser uma cidade pequena, com um pouco mais de 115 mil habitantes, e ter concentrado a maior parte de pretos escravizados, a região abriga uma população negra mais numerosa, o que trouxe mais conforto e reconhecimento do que as grandes cidades mineiras como Juiz de Fora, por exemplo. “O interior é bom pra conviver com pessoas mais próximas a mim, lá pude ver minha avó e fazer atividades ao ar livre, como ir a cachoeira. Há, no lugar, outras pessoas pretas por perto que me deixaram mais à vontade e, dessa forma, pude observar hábitos e como as pessoas vivem na região”, comenta. Na região é possível conhecer a Pedra Redonda, o Horto Florestal e a Antiga Estação Ferroviária de Ubá.
4 – Parque Nacional Chapada dos Veadeiros (GO)
Situado em Goiás, com acesso pelas cidades Alto Paraíso e São Jorge, a Chapada dos Veadeiros foi um dos lugares que surpreendeu positivamente Iléia. Apesar de não encontrar tantas pessoas negras como ela, a presença de uma guia, que ofereceu um turismo sem perspectiva embranquecida, fez toda diferença para a educadora. Iléia indica no destino a hospedagem no Quilombo Kalunga. “Foi muito gratificante, porque a gente recalcula a rota e vê que temos lugar no mundo”, afirma. Além do quilombo, vale conferir as cachoeiras da Prata, Santa Bárbara e o Vale das Araras.
5 – Marrocos
Bem ao norte do continente africano, Marrocos também está bem próximo da Europa, fazendo fronteira com a Espanha. “A experiência foi muito acolhedora justamente por ter muita gente diferente e a pluralidade me trouxe segurança, mesmo sendo preta. Me senti à vontade também por ter muçulmanos e isso trouxe muito da cultura do meu pai, que era um homem muçulmano preto”, afirma Amina Bawa. Os destaques para quem viaja ao país são Marrekch, Fez (com seu mercado público central), além de passar pelo menos uma noite no deserto do Saara. A Brafrika Viagens está organizando um grupo para setembro.
6 – Cabo Verde
Cabo Verde é um país insular, localizado no Oceano Atlântico, próximo a costa noroeste do continente africano e ao Senegal. O arquipélago possui 10 ilhas, sendo nove habitadas, são elas: Santo Antão, São Vicente, Santa Luzia (desabitada), São Nicolau, Sal, Boa Vista, Maio, Santiago, Fogo e Brava. Há uma população preta predominante, porém, em algumas ilhas, as etnias variam devido à miscigenação com o colonizador – e por isso, o colorismo é um tema debatido por alguns cabo-verdianos. Há a valorização das tradições africanas e muita representatividade vista em diversas publicidades pretas, trazendo o sentimento de pertencimento ao viajante negro, de acordo com outra experiência turística de Amina.
A língua oficial de Cabo Verde é o português, mas é o crioulo cabo-verdiano, que mistura o português com dialetos locais, o mais falado por eles – vale destacar que inclusive o crioulo varia um pouco de ilha para ilha, mas sem diferenças muito gritantes. O idioma é uma das maiores riquezas identitárias do país e também usado por alguns como símbolo de resistência da cultura preta. O brasileiro ali sente uma familiaridade na comunicação, ainda que seja diferente do português brasileiro. Indico escutar alguns artistas renomados locais para ir pegando o jeito (e se encantando), entre eles, Cesária Évora e Mayra Andrade.
Os principais roteiros feitos na região são: a Ilha de Santo Antão, onde é possível estar mais em contato com a natureza e fazer boas trilhas e escaladas por montanhas, lá também é produzido uma das melhores aguardentes de cana de açúcar, conhecida como “grogue”, que harmoniza com caldeirada de cabrito com feijão. Há também a Ilha de São Vicente, onde está a cidade do Mindelo, a mais cosmopolita do arquipélago, com efervescência cultural e berço de Cesária Évora. Por lá há casas de jazz e se assemelha com o Brasil por festejar também o Carnaval, geralmente acontece após a festa brasileira, no mês de março.
Já Santiago é a maior ilha do arquipélago e nela fica a Cidade da Praia, capital de Cabo Verde e onde vive mais da metade da população do país. O local concentra montanhas, ruínas, mercados, personalidades da cultura africana, artesanato e produtos agrícolas para conhecer. Na Ilha do Sal há uma comunidade de imigrantes senegaleses (por lá também é falado o francês). Essas são as principais rotas, mas, o país possui tantas outras imperdíveis para fazer – é preciso separar bons dias para passar e aproveitar tudo que o lugar oferece. Há praias de areia branca, em sua maioria, e de um mar azul fascinante, bem parecido com o Caribe, e também uma boa gastronomia, como a cachupa e a lagosta suada que são especialidades cabo-verdianas.
7 – Barbados
Barbados é uma das ilhas que compõem o Caribe e ficou ainda mais conhecida com a barbadense Rihanna, que se tornou heroína local recentemente, durante a celebração da oficialização do país como uma república. Barbados possui uma população preta, em sua maioria, e a língua oficial é o inglês – porém, os nativos também se comunicam com um “inglês diferenciado”, o bajan, que é a mistura do inglês com o creole e que pode ser visto na música “Work” de Rihanna.
O país segue atualmente com uma proposta de fomento ao turismo, um dos principais setores que aquece a economia na região. Em Barbados, há o incentivo de atividades focadas na natureza e bem-estar, como esportes aquáticos, por possuir inúmeras praias atraentes, são elas: Accra Beach, Hastings Rocks, Peebles Beach e Brownes Beach. Há outras mais desertas como a Brandons Beach e Brighton Beach. Para conhecer as belezas naturais do lugar, há passeios de barco pelo litoral com direito a prática de snorkeling para conferir de perto a vida marinha.
Há também muitos bares pelas ruas, desde simples até os mais gourmets, e lugares para curtir a noite, como o Harbour Lights que traz uma programação diferente cada dia, com música, jantares e bebidas liberadas. Por falar nisso, o rum é a bebida tradicional de Barbados – então dar uma passada na destilaria Mount Gay pode ser uma boa oportunidade para degustar o destilado, que é produzido há mais de 300 anos no país. Já a experiência gastronômica traz influências africanas, ameríndias e europeias.
Dentro da efervescência cultural há o famoso carnaval de Barbados, o Crop Over, que acontece pelas ruas da capital Bridgetown e traz algumas semelhanças estéticas (em relação às fantasias) com o carnaval carioca e paulistano. A festividade sempre acontece no mês de agosto e sua origem está na celebração do final da safra da cana-de-açúcar, uma tradição local (e ingrediente base para a produção de rum).
8 – Recife/Olinda
Recife é a capital do frevo, do maracatu e possui o Museu da Abolição, estátua de Zumbi e eventos como a terça afro, que ocorre no Pátio de São Pedro e reúne afroempreendedores e apresentações culturais. Há ainda espaços como o Armazém do Campo que tem apresentações culturais ligadas a Cultura Negra. De acordo com uma pesquisa encomendada pela empresa de consultoria em diversidade AFAR Ventures para a startup de pesquisa online, Painel BA, a cidade é uma das mais desejadas pelos afroviajantes em 2022 (20% da preferência). Vizinha da capital, Olinda tem um roteiro de afroturismo chamado Caminhada Olinda Negra, realizada pelo Alafin Oyó em parceria com o Guia Negro. A cidade também abriga manifestações como coco e cavalo marinho, além de ser sede do Terreiro de Xambá, um dos poucos dessa nação no Brasil. Nas duas cidades, a noite dos tambores silenciosos são pontos altos do carnaval, que neste ano não teve apresentações na rua por conta da pandemia.
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