Medida proposta pelo vereador de São Paulo, Aurélio Nomura (PSDB), atingirá pelo menos 20 barracas de comidas como acarajé, fogaça, pastel e tapioca, além de 30 de artesanato; clientes se opõem ao projeto
Texto: Guilherme Soares Dias | Edição: Nataly Simões | Imagem: Divulgação*
Os comerciantes que trabalham na Feira do bairro da Liberdade, em São Paulo, aos sábados e domingos, estão preocupados com o projeto de Lei 703/2020 proposto pelo vereador Aurélio Nomura (PSDB), que institui a “Feira Oriental da Liberdade” para a “valorização e difusão da cultura oriental”. O projeto veta a possibilidade de vendas de produtos que não sejam orientais. O local, no entanto, tem barracas de comidas como acarajé, fogaça, pastel, tapioca, caldo de cana, além de artesanatos diversos. Caso a medida seja aprovada, atingirá pelo menos 20 barracas de comida e outras 30 de artesanato de feirantes que já atuam no local.
O projeto foi aprovado em primeira instância e circula na Câmara Municipal para votação em segunda instância. Além de atingir comerciantes que já atuam na feira, a lei contribuiria para o apagamento da história do bairro, que foi o primeiro habitado por negros em São Paulo nos séculos 18 e 19, antes mesmo dos japoneses chegarem. “O nome da praça vem do povo negro pedindo liberdade a um homem negro (Francisco José Chagas), que estava sendo enforcado. O local se chamava Largo da Forca”, ressalta o feirante George Teixeira de Souza, 51 anos, que há cinco vende acarajé e tapioca na feira.
Para Souza, o local não pode ser apartado da história que aconteceu antes da chegada dos japoneses. Apesar de atuar em outras feiras, a principal fonte de renda vem das vendas nos fins de semana na Liberdade. “Vender acarajé é uma experiência interessante. Os orientais são meus principais clientes, por que o camarão é algo difundido entre eles”, explica. O feirante acredita que retirar pessoas que vendem produtos que não são orientais acabaria com a diversidade e “jogaria para debaixo do tapete” a história negra do bairro.
Mesmo comerciantes descendentes de japoneses são contra a medida. É o caso de Edson Yamaguchi, 30 anos, que está há quatro anos na Feira da Liberdade, é filho de japoneses (nissei) e vem de uma família que há 40 anos trabalha em feiras. Ele vende pastel nos fins de semana e diz que o projeto de lei está “totalmente errado” e vai afetar quem já trabalha lá. “Sou a favor da diversidade, quanto mais opções tiver, isso agrega ao bairro. Conheço pessoas que vão na feira comer acarajé. O turista quer comer coisas do Brasil e o o bairro da Liberdade tem história (negra) por trás”, argumenta.
Yamaguchi reitera que é japonês e que não atua contra a sua cultura, mas se opõe ao que chama de segregação. O projeto de lei também estabelece que um conselho gestor formado por cinco comerciantes com mais de oito anos de atuação e “conhecedores da cultura oriental” decidiria quem poderia atuar na feira. “É um espaço público que acabaria virando um leilão”, diz. Edson encabeçou um abaixo assinado contra o projeto e já reuniu mais de 7 mil assinaturas.
O vereador Reis (PT), que defende a instalação do Memorial dos Aflitos, para contar a história negra do bairro, afirma que conversou com o vereador que propôs o projeto de lei para proibir produtos não orientais. “Nomura diz que estuda a retirada do projeto. A Praça da Liberdade encheu de gente vendendo outros produtos, já que a feira de artesanato está proibida por conta da pandemia. A intenção era proibir esses novos comerciantes, não quem já atuava antes”, afirma. O vereador Aurélio Nomura foi procurado pelo Alma Preta, mas não se posicionou até a publicação desta reportagem.
Em junho de 2018, a praça recebeu a alcunha de Liberdade-Japão e a estação de metrô passou a ser chamada de “Japão-Liberdade”. Na época, movimentos tentaram reverter a mudança. Em agosto de 2019, a Prefeitura de São Paulo colocou uma placa discreta na saída do metrô lembrando que ali funcionou o Largo da Forca. O movimento negro luta para que o bairro ganhe o Memorial dos Aflitos e restaure a Capela dos Aflitos, que fazem parte da história negra da região.
*Texto originalmente publicado no Alma Preta
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que país é esse ? o país é nosso , querem roubar nossos direitos ? soterrar nossa história ñ vamos aceitar e nem podemos permitir que isso aconteça , fora orientais.