Em entrevista exclusiva ao Guia Negro, a escritora refletiu sobre a passagem do tempo, autocuidado e os novos rumos da carreira
“Às vezes a gente fica se comparando com o outro e esquece que cada um tem o seu caminho”. Ao completar 45 anos, a escritora best-seller e filósofa Djamila Ribeiro refletiu sobre o seus planos, conquistas e a passagem do tempo em entrevista ao Guia Negro. De passagem por Salvador, participando da agenda de eventos em comemoração ao Dia da Mulher Negra, a autora de ‘Pequeno Manual Antirracista’ comemora o amadurecimento e diz estar “feliz, saudável e bem consigo mesma” nessa fasa da vida.
“Alguns anos atrás eu não podia falar nada que virava assunto. Era uma perseguição absurda, e tentaram me colocar como uma mulher que maltratava as mais jovens, e arrogante”, destaca a pensadora quando perguntada sobre as tentativas midiáticas de construção de imagem da mulher negra como uma pessoa austera. Apesar de ser um fato incômodo no início da carreira, hoje ela lida de outra maneira. “Não tem como as pessoas sustentarem uma ideia sobre você, quando você tem certeza de quem você é”, pondera.
“Oxóssi não tem pressa”
Uma das características das quais Djamila mais enfatiza com orgulho, é ser de Candomblé e filha de Oxóssi, o orixá das matas e caças. Esse arquétipo faz jus à escritora, que vem colhendo os frutos de uma carreira com marcos notáveis. Recentemente, ela veio de uma turnê internacional do lançamento de ‘Where We Stand’, versão em inglês do seu primeiro livro ‘O Que é Lugar de Fala’, passando pela África do Sul, França, Inglaterra e outros países.
E depois de lecionar na NYU – New York University, ela prepara-se para dar aulas no MIT – Massashusetts Institute of Technology, uma das melhores universidades do mundo. Sobre o reconhecimento internacional, a autora comenta que muitas pessoas ainda ficam surpresas, “porque numa sociedade como a nossa, em que a mulher negra ocupa esse lugar de subalternidade, as pessoas não tem nem repertório para lidar quando a gente desestabiliza aquele lugar que é imposto pra gente.”
Analisando seu passado, Ribeiro enfatiza a importância da criação de novos repertórios para a comunidade negra. “Eu não tenho vergonha nenhuma de falar isso: a primeira vez que eu peguei um voo internacional eu ficava olhando as pessoas do lado para imitá-las. Eu não tinha repertório, porque eu não passava as férias na infância viajando com meus pais. A gente não tem repertório para lidar com o sucesso, quando o nosso entorno continua sem ter aquela realidade de sucesso”, relata.
Para lidar com a notoriedade e o reconhecimento, ela confessa que não abre mão dos autocuidados. Gosta de mexer nas plantas, medita toda manhã, pratica kung fu (com o objetivo de mudar de faixa) e se atenta à espiritualidade com seus assentamentos. “É muito difícil lidar com ataques e dificuldades o tempo todo. A inteligência intelectual é importante, mas a gente tem que trabalhar a inteligência emocional e espiritual”, defende.
8 anos do primeiro livro
Em 2025 Djamila também comemora o aniversário de 8 anos do primeiro livro ‘O Que É Lugar de Fala’, e relatou com exclusividade que prepara uma edição ampliada com previsão de lançamento ainda para este ano. “Quando eu lancei esse livro gerou muito incômodo, e teve grupos que deturparam deliberadamente. Um livro que fala que linguagem é poder, e que a gente precisa criar pluralidade e romper com a voz única, claro que vai incomodar”, afirma.
A nova edição pretende fazer uma digressão sobre os impactos que a obra trouxe para as discussões sócio-políticas. Ancorada pela literatura, Djamila defende a força dos livros para a sociedade, mesmo com as notícias desanimadoras de que o Brasil têm tido menos leitores. “Mesmo quando o que estava se apresentando na minha vida era muita dureza, a literatura me mostrou essas frestas de doçura, de liberdade”, analisa. E se depender dela, vamos continuar enxergando novas frestas por meio da sua palavra.
Confira a entrevista completa aqui.