Novo episódio: Caminhada São Paulo Negra é alvo de racismo da Polícia Militar SP

A Caminhada São Paulo Negra foi alvo – novamente – da abordagem racista promovida pela Polícia Militar de São Paulo. Desta vez, o ataque ocorreu no dia 27 de março deste ano, durante o evento promovido pelo Guia Negro. O encontro acontece, pelo menos, duas vezes por mês e tem a proposta de apresentar localidades que contam a história da população preta da cidade, fomentando o afroturismo. A ideia deu tão certo, por seu ineditismo, que se expandiu para outras regiões do país.  

O novo episódio se deu enquanto a anfitriã de experiências da equipe da Caminhada socorria uma participante que caiu em um enorme buraco na rua, próximo ao Largo de São Francisco, na região da Sé, no centro da cidade. Ao remover um cone do outro lado da via a fim de sinalizar o buraco e evitar outro acidente, a profissional foi questionada por um PM de forma agressiva, que a acusou de agir contra o patrimônio público.  

“Neste momento, um repórter branco que participava do evento conosco interpelou a favor da anfitriã, que é negra como toda a equipe das Caminhadas Negras. Antes de terminar a frase, o mesmo policial que impedia a nossa profissional de executar a ação entregou prontamente o cone para o homem. Ele (o policial) deve ter achado que ela roubaria o cone, afinal o negro é sempre o vilão, como canta o Bloco Ilê Aiyê. Isso é racismo estrutural, essa diferença de comportamento, é sobre isso que falamos durante o encontro e continuamos a viver a história enquanto a contamos”, denuncia Guilherme Soares Dias, jornalista e idealizador do Guia Negro.  

Reincidência  

Há dois anos, o Guia Negro foi alvo do mesmo racismo estrutural praticado pela Polícia Militar de São Paulo. No dia 24 de outubro de 2020, integrantes da Caminhada São Paulo Negra foram perseguidos pela PM durante três horas, baseada em um oficio que denunciava o evento como uma manifestação. De acordo com Guilherme, todos os participantes foram intimidados e constrangidos, o que prejudicou a realização do trabalho, na ocasião. Após o acontecimento, no dia 11 de dezembro do mesmo ano, a plataforma realizou uma caminhada para policiais que faziam o curso de formação em direitos humanos. “Adoraríamos que ele se tornasse obrigatório dentro da PM. Não nos criminalizem, valorizem o nosso trabalho! Não vamos deixar o racismo estrutural nos parar e nem calar”.  

O racismo estrutural da Polícia Militar 

Durante o primeiro semestre de 2020, São Paulo bateu o recorde de mortes decorrentes de ações policiais. O dado acompanha a realidade do país que obteve no ano o maior número de pessoas mortas pela polícia em toda a série histórica do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, que na ocasião divulgava o 15º Anuário de Segurança Pública. O levantamento apontou 1.245 assassinatos por agentes no Rio de Janeiro, seguido de Bahia, com 1.137 casos e São Paulo, com 814 óbitos. E quem mais morre pelas mãos da Polícia?  

De acordo com o documento, 78,9% dos brasileiros mortos pela PM eram negros, a taxa de letalidade é 2,8 vezes maior entre negros do que entre brancos. Pretos e pardos representam 4,2 vítimas a cada 100 mil habitantes, enquanto que entre os brancos o número é de 1,5 a cada 100 mil. Casos recorrentes noticiados pela imprensa reforçam esses dados em diferentes regiões do país. Desde ações truculentas, prisões equivocadas, até as consequentes mortes.  

Abordagens despreparadas são comumente praticadas pela polícia paulistana, como no caso em que um agente aparece em filmagem arrastando um homem preto algemado em uma moto (2022). No Rio de Janeiro, casos como esse acontecem diariamente, como o de uma mulher agredida durante o protesto pela morte de um adolescente, lutador de Jiu-Jitsu morto pela PM em São Gonçalo, Zona Metropolitana do estado (2022). Em Goiás, a abordagem policial truculenta ao atleta Filipe Ferreira foi viralizada no ano passado. 

Por conta do histórico ostentado pelas corporações, uma pesquisa divulgada pelo Datafolha, em 2019, aponta que 51% dos brasileiros têm mais medo do que confiança na Polícia Militar. O sentimento é fruto de uma construção social desde o período colonial no Brasil – e que se agravou com o passar dos anos. Desde o século 18, com a criação da Divisão Militar da Guarda Real de Polícia da Corte, a decisão de perseguir alguém tinha como fator determinante a cor da pessoa (cartilha que se mantém atual como o caso polêmico do material distribuído pela PM de Diadema – SP, em 2015, nas escolas com dicas de segurança em que todos os personagens que simbolizavam criminosos eram pretos).

Desta forma, negros eram proibidos de se reunirem em grupo. A criação das Guardas Municipais Permanentes, já no século 19, precursoras das polícias militares, também mantinham o objetivo de manter a ordem nas ruas, colocando a população preta à margem. Nos anos 40, vigorava a lei na qual alguém entregue à ociosidade, sem trabalho, ou que conseguisse se manter a partir de ocupação ilícita era enquadrado no crime de vadiagem – o que impactava diretamente à população preta que se desenvolveu sem políticas públicas que lhe assistisse, com inserção nas bases de educação e posteriormente no mercado de trabalho.  

 

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Redação

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