Abdias Nascimento: exposição de um dos maiores intelectuais negros ocupa o Masp

“Abdias Nascimento – um artista panamefricano” é a maior mostra dedicada ao trabalho visual do artista e ocupa o Museu de Arte de São Paulo (Masp). Com curadoria de Amanda Carneiro e Tomás Toledo, a exposição é realizada em parceria com o Ipeafro (Instituto de Pesquisas e Estudos Afro-brasileiros), instituição criada por Abdias, e reúne 61 pinturas realizadas entre os anos de 1968 e 1998.  

 O subtítulo “um artista panamefricano” é uma mescla que alude tanto ao movimento pan-africanista, pelo qual Abdias Nascimento lutou durante o seu exílio nos Estados Unidos (em decorrência do golpe militar no Brasil, na década de 70), quanto ao termo “amefricano”, cunhado por Lélia Gonzalez, que foi amiga e interlocutora do artista, para referir às culturas negras na América Latina.  

Com a finalidade de expor conceitos defendidos por Abdias, como o quilombismo, a cultura afro-brasileira e a história dos povos escravizados nas Américas, a pintura emblemática “Okê Oxóssi” (1970) é o ponto de partida para a exposição. O quadro impactante, que é uma clara crítica à ditadura militar e ao ufanismo da época, retrata a bandeira do Brasil e símbolos do orixá Oxóssi: um grande ofá e a palavra Okê, no lugar dos dizeres “Ordem e Progresso (ferramenta e saudação relacionados à divindade africana).  

Sendo Oxóssi o caçador de uma flecha só, Abdias em sua mira certeira transforma uma de suas obras mais consagradas em uma herança atemporal, uma vez que “Okê Oxóssi” é extremamente atual em relação ao cenário político de hoje em dia, mantendo a crítica sobre o sequestro do simbolismo da bandeira nacional e os riscos à democracia brasileira. A mostra é dividida em sete núcleos: Teogonia afro-brasileira, Quilombismo, Deuses vivos, Germinal, Sankofa, Axé da esperança e Axé de sangue e permanece no Masp até o dia 05 de junho.  

 Abdias Nascimento  

Abdias Nascimento (1914 – 2011) foi um poeta, escritor, dramaturgo, ator, diretor de teatro, ativista pan-africanista, pintor, jornalista e professor universitário. Além de todos os títulos, também foi deputado federal e senador no Rio de Janeiro. Abdias participou da formação da Frente Negra Brasileira (FNB), importante organização do movimento negro (durante a primeira metade do século 20), e fundou o Teatro Experimental do Negro e o Museu de Arte Negra (MAN). Em 1955, organizou o concurso “Cristo de cor”, que buscava a representação de um Jesus negro e contou com a participação de, inclusive, a pintora Djanira. As obras do artista foram exibidas nacional e internacionalmente e aborda a cultura africana em prol do combate ao racismo.  

LEIA MAIS:

Racismo linguístico é sobre palavras?

Oito lugares para você conhecer em 2022

Curuzu é o Soweto brasileiro; ouça o podcast

 

Compartilhe:
Avatar photo
Joyce Nascimento

Jornalista por formação e atuação, desenvolve escritas a partir do que sente, do que vivencia e de suas pesquisas. Sua caminhada é também laboratório de informações. Sambista, ex-passista da Mangueira e do Paraíso do Tuiutí, e candomblecista, visa escurecer as coisas versando com a cultura de sua origem afro-brasileira e com povos tradicionais de matriz africana

Artigos: 18

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *