Sem exposição, Museu Capixaba do Negro resiste com ações dos movimentos sociais

Prédio no centro de Vitória funciona como espaço de discussão política e atividades culturais desde 1993, mas não recebe atenção da prefeitura

Guilherme Soares Dias

Ao chegar em Vitória e descobrir que existe um prédio que abriga o Museu Capixaba do Negro (Mucane) desde 1993 há uma alegria seguida de uma decepção. O Mucane fica no centro da capital capixaba, em prédio que pertence à Prefeitura de Vitória e é gratuito. Mas só. O Guia Negro esteve no local e a exposição permanente está em manutenção. Nenhuma atividade ou visita guiada era oferecida e a história do espaço tampouco recebe uma mostra.

O museu conta com auditório, biblioteca, palco, salas multiuso, além de espaço expositivo. A reportagem tentou visitar o museu no sábado, mas estava fechado. Na terça-feira seguinte, durante o horário de funcionamento, que ocorre de terça a sexta-feira das 12h às 19h, não havia exposição disponível para visita. Em entrevista ao Guia Negro, a coordenadora do museu, Thaís Amorim afirma que o acervo está na reserva técnica e que o museu não tem aberto aos fins de semana. “É um espaço em que artistas e militantes usam para se reunir”, diz.

Thaís Amorim afirma que entre as obras do museu estão artistas locais como Kica Carvalho, Charlene Bicalho e Castieu Vitorino. Por lá, também funciona o Movimento Negro Unificado (MNU) e há lançamento de livros, colônia de férias, grupos de estudo e atividades voltadas para a população negra, como dança afro. A coordenadora do museu explica que os museus municipais de Vitória (que incluem também a Casa Porto de Artes Plásticas e o Museu do Pescador) de Vitória passam por plano museológico, com revisão dos seus acervos.

A história da psiquiatra Maria Verônica Pas (1948-1996), fundadora que dá nome ao espaço, também deve ganhar mostra permanente. “Esse é um espaço vivo, que funciona como uma extensão e casa para os movimentos negros. Falamos o tempo todo da gente, mas a relação entre o poder público e a sociedade civil não é fácil”, admite Thaís, que é funcionária pública e militante do movimento negro.

Verba. O espaço não recebe destinação fixa de verbas da prefeitura. O secretário de Cultura de Vitória, Francisco Grijó, não soube informar quanto a prefeitura destinou em 2018 ou no primeiro semestre de 2019. Ele diz que a governo municipaç estipula um valor variável, que inclui a manutenção do espaço e funcionários. “Mas tudo que precisa ser realizado é feito”, garante. O museu também não possui site próprio, com a programação ou informações de atividades, seguindo determinação da gestão atual da prefeitura de que os órgãos não tenham páginas virtuais independentes, segundo informou Grijó. Sobre o fato de o museu não ter um site ou programação frequente para atrair visitantes, Grijó diz que há uma resistência da comunidade negra em relação a transformar o local em turístico. “Que bom que está me dando essa devolutiva. Agora, realmente precisamos melhorar a comunicação institucional”.

Abertura de exposição realizada em 2018

Apesar de 51% dos cerca de 400 mil habitantes de Vitória se declararem negros (de cor preta ou parda), o secretário diz que o museu tem “recorte muito específico”. “Não damos atenção especial ou prioridade”, afirma, respondendo sobre qual a importância que o museu tem dentro da gestão municipal. Grijó se autoclassifica como “afrodescendente”, e diz que o museu possui gestão e conselhos próprios, que realiza editais e participa de fomentos públicos, além de funcionar como espaço político. O secretário também não soube precisar quando a exposição permanente volta em cartaz e qual será a próxima mostra do museu.

História. O edifício onde está instalado o Mucane foi construído em 1912. No início, o prédio composto por dois pavimentos foi ocupado por três famílias que instalaram suas lojas no térreo. Em 1923, por meio de uma permuta o prédio tornou-se propriedade estadual. Um ano depois, após reforma, recebeu o Correio de Vitória e, mais tarde, o telégrafo. Em 1935, passou a sediar o então Departamento de Estatística Geral. Anos depois, o térreo do prédio passou a ser ocupado por uma delegacia e pela cooperativa dos servidores públicos. Em 13 de maio de 1993, foi instituído o Museu Capixaba do Negro “Veronica da Pas” (Mucane).

Desde 2012, o prédio é gerido pela prefeitura. Em 2018, o espaço realizou quatro oficinas regulares nas áreas de dança, música e contação de histórias. De acordo com a Secretaria Municipal de Cultura de Vitória, o museu realizou 47 ações e atendeu um público de 16 mil pessoas no ano passado.

Serviço: De terça a domingo, das 12h às 19h. Gratuito.

Fica na Avenida República, 119, 2º Andar, no centro de Vitória.

Mais informações no site da Prefeitura.

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Redação

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